segunda-feira, 17 de agosto de 2009
CD: "Nove" (Ana Carolina) - Para o santo não entediar
"A minha oração é bem curta pro santo não entediar". Mais do que um verso de uma das nove faixas de "Nove", novo álbum de Ana Carolina, essa frase está transcrita em seu luxuoso encarte. Antes mesmo de chegar às lojas, o novo trabalho da cantora mineira já causou polêmica pelo fato de conter "apenas" nove faixas. Como se quantidade significasse qualidade. Para derrubar qualquer argumento crítico com relação à pouca quantidade de músicas, basta citar "Urubu", de Antonio Carlos Jobim, e que contém apenas oito faixas. (Só citei "Urubu" porque foi o primeiro disco com poucas faixas que veio à minha cabeça.)
Bom, "Nove", último álbum de Ana Carolina, lançado na semana passada, está muito distante de "Urubu" - e o intuito aqui não foi fazer uma comparação qualitativa, mas, tão somente, com relação ao número de faixas. Em compensação, ele prova que quantidade não é documento. Isso porque, "Nove" soa superior a "Dois Quartos", o gorduroso CD duplo que Ana Carolina lançou em 2006, e que tinha nada menos que 24 faixas (?!?).
Para os detratores do trabalho de Ana Carolina, a crítica é fácil: "só terei que suportar nove músicas novas". Esse não é o caso aqui. Tudo bem, se você não gosta de Ana Carolina, pode ter certeza que não será "Nove" que fará com que você se torne fã da cantora. "Nove" é, sim, melhor do que o anterior "Dois Quartos", mas também não pode ser considerado "o grande álbum de Ana Carolina". Aliás, se Zélia Duncan e Adriana Calcanhotto já lançaram um grande álbum ("Pelo Sabor do Gesto" e "Maritmo", respectivamente), Ana Carolina ainda está devendo o seu "grande álbum". Infelizmente a oportunidade, mais uma vez, foi perdida com "Nove".
Há boas canções em "Nove", não há dúvidas. Mas falta um laço conceitual entre elas. E a grande quantidade de participações especiais (1/3 do disco) acaba dando a impressão de que Ana Carolina quis atirar para todos os lados. Apesar da ótima produção de Alê Siqueira (em três faixas) e da dupla Mário Caldato / Kassin (nas seis restantes), as participações de John Legend, Chiara Civello e Esperanza Spalding soam excessivas e deslocadas.
"Entreolhares (The Way You're Looking At Me)" possui um ótimo arranjo de metais de Lincoln Olivetti. Mas para quê a voz de John Legend? Não se trata de implicância. Mas por que essa mania tupiniquim de colocar um artista internacional para participar do álbum. Será que dá mais credibilidade? Será que os executivos da gravadora pensam que Ana Carolina não se garante se não tiver um encarte repleto de nomes estrangeiros escritos? E o que dizer de "Resta"? O potente arranjo de cordas de Arthur Verocai não é o suficiente? É necessário colocar uma mulher cantando em italiano? Ah, fica mais chique...
Quando Ana Carolina resolve cantar sozinha, tudo fica muito mais natural. Basta ouvir a faixa de abertura do álbum, "10 Minutos (Dimmi Perché)", um tango eletrônico produzido por Alê Siqueira e que tem todo o jeitão de hit. "Tá Rindo, É?" é outro destaque de "Nove". Produzida por Mário Caldato e Kassin, a faixa é moderna e deliciosa, com mais um bom arranjo de metais (dessa vez a cargo de Felipe Pinaud) e os teclados e o "talk box" de Donatinho. Seguindo o mesmo estilo mais moderno, "8 Estórias" não desce tão bem, com a sua letra cansativa, que cita o nome de diversas mulheres, de Giovanna a Carmen. As coisas melhoram (e muito) com o samba (cheio de barulhinhos eletrônicos) "Torpedo", composto por Ana Carolina, Gilberto Gil e Mombaça. E nem precisou chamar nenhum gringo para cantar...
No final das contas, a impressão que ficou foi a de que, a despeito do pequeno número de faixas, "Nove", apesar de melhor, ainda soa tão gorduroso quanto o seu antecessor de estúdio "Dois Quartos". Talvez o problema não seja exatamente o número de faixas. Mesmo com oração curta, o santo ainda pode entediar...
Cotação: ***
***** Ótimo
**** Muito Bom
*** Bom
** Regular
* Ruim
Por Érika Lima, Equipe Ana Por Inteiro.
Fonte: Esquina da Música.